Haddad, Daniela Mercury, ONU e movimentos sociais lançam campanha Livres e Iguais

Carta Maior

A noite de ontem foi palco do lançamento em São Paulo de uma importante campanha da Onu, a “Livres e Iguais”, que busca combater a homofobia e defender a perspectiva de que os direitos LGBT são direitos humanos. Partindo dessa visão, a campanha tem também o objetivo de promover a igualdade de direitos de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis.

Na cerimônia, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, afirmou que os presentes estavam reunidos na sede da prefeitura “defendendo os direitos iguais, porque não somos iguais.” Segundo Haddad, quando “a gente brada por respeito à orientação das pessoas e à diversidade, que é uma das marcas da humanidade, o fazemos justamente porque a luta pela igualdade e pela diversidade se dá em nome das diferenças”.

Para o prefeito, ao defender essas questões, “na realidade estamos defendendo um princípio, de respeito aos indivíduos de uma espécie, e que convivem em uma mesma comunidade. E isso só se constrói com educação e com militância. Porque muitas vezes não se consegue resolver as coisas só com educação”.

No evento, foi exibido o vídeo da ONU sobre a campanha (disponível aqui), e Haddad tratou de “agradecer a escolha da cidade para sediar mais uma edição da Parada do Orgulho LGBT”. O prefeito destacou que “São Paulo é uma cidade da diversidade, que se fez na diversidade, que tem sua força na diversidade”. Para ele, é “preciso se pensar a questão da imigração, da migração e da diversidade da forma mais generosa possível”.

Diversidade e intolerância

Convidada para o lançamento ontem em São Paulo, a cantora Daniela Mercury apresentou sua avaliação de que “essa campanha da ONU é espetacular”. Daniela também gravou um belo depoimento de apoio à iniciativa. Embaixadora do UNICEF no Brasil e Campeã da Igualdade da ONU, ela registrou que também parou de falar o nome dos deputados que atacam os direitos LGBT. “Estávamos promovendo muita gente que não devíamos. Eles acreditam que seja uma causa desimportante, especialmente em ano de eleição”.

Para Daniela, o tratamento dispensado ao tema por alguns políticos é realmente “algo perigoso. Ainda mais em um país onde a religião tem criado mais intolerância, em vez de criar amor”. Eu também sou católica, e aprendi desde pequenininha que deus é amor. O que falta é educação para a vida, aprender como se comportar com os outros.

Para o prefeito Haddad, não se pode “aceitar esse conflito artificialmente construído, entre a defesa da diversidade e a defesa da liberdade religiosa, entre a orientação sexual das pessoas e suas crenças”. Ele entende que é fundamental se evitar que “isso se transforme em violência, em ódio, em preconceito, em sofrimento. Não podemos cair nessa”. O prefeito afirmou que o caminho passa por construir um mundo (e uma São Paulo) “mais solidário, mais feliz, mais amoroso”.

Pauta paulistana

Rogério Sottili, secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, destacou que a campanha “discute algo que deveria ser simples, que é uma luta antiga, mas que ainda não alcançamos: a liberdade e a igualdade de todas e todos!”.

Sottili relembrou ao público alguns dos dados mais recentes da ouvidoria nacional de direitos humanos, segundo os quais, somente em 2012, foram recebidas 10 mil denúncias de crimes motivados por homofobia no Brasil. Além disso, destacou que quase uma pessoa é morta por dia no país por conta da homofobia. “São dados assustadores e não podemos nos omitir diante dessa realidade”.

O secretário de direitos humanos lembrou, ainda, que o lançamento na cidade da campanha mundial contra a homofobia ocorre oportunamente durante o 18º mês do Orgulho LGBT de São Paulo, que tem por lema o combate à homofobia.

Sottili destacou que o mês do Orgulho LGBT conta com uma série de atividades:

“Além deste ato, na próxima 5ª feira (1o de maio) haverá a Feira da Diversidade na Praça da República, no sábado acontecerá a Caminhada Lésbica e no domingo teremos a tão esperada Parada do Orgulho LGBT, a maior do gênero do mundo!”. Os eventos em questão são organizados pela Associação da Parada do Orgulho LGBT com o apoio da Prefeitura de São Paulo.

Para o prefeito Haddad, “também é importante termos uma perspectiva histórica. E, de certa forma, temos de reconhecer que essa luta, em parte, trata de algo recente. E, tanto no Brasil quanto em vários outros países, assistimos a alguns avanços importantes”.

O secretário Sottili concordou, registrando que o movimento LGBT teve muitas conquistas nos últimos anos, como o reconhecimento da igualdade de direitos pelo Supremo Tribunal Federal, o que possibilitou a institucionalização da união civil entre pessoas do mesmo sexo.

Para Sottili, contudo, “ainda há muito a avançar. A homofobia é inadmissível em todos os aspectos. Precisamos garantir respeito, direitos e, urgentemente, a integridade física e moral das pessoas LGBT”. Nesse sentido, a secretaria municipal de Direitos Humanos e Cidadania da capital paulista conta com uma coordenação específica para o tema, com o objetivo de articular ações transversais para a construção de políticas públicas destinadas às lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.

Igualdade e liberdade

Keila Simpson, uma das mais importantes lideranças LGBT do país, afirmou durante a cerimônia que “o tema dessa campanha é muito importante, pois não temos isso hoje no Brasil. A gente não é igual, a gente não é livre”. Keila afirmou que “a gente quer liberdade e igualdade, e a gente consegue”, arrancando aplausos dos presentes. Antes, ela havia agradecido a Daniela Mercury “por trazer à tona, por levar à mídia essas questões, por falar para todos do amor que sente pela sua companheira”.

Keila criticou o papel do Congresso Nacional nessa temática, afirmando que prefere não mais falar também os nomes das pessoas que atacam os direitos LGBT. Para ela, agora com essa campanha, “temos algo para mostrar para eles, para mostrar que, mundialmente, agora existe essa movimentação para defender os nossos direitos”.

Em sua participação, Daniela Mercury não deixou de envolver o público com seu carisma e arte, por exemplo quando puxou o coro para que todos cantassem juntos que “qualquer maneira de amor vale a pena”. Ela lembrou ser filha de assistente social: “Pra mim, gente é gente, e gente não tem padrão”. Segundo Daniela Mercury, “a gente acaba achando que só é certo o jeito que a gente vive em casa, no nosso núcleo”.

A cantora destacou que o vídeo produzido pela ONU mostra como as famílias se separam nessas situações, e elas acabam por “se voltar contra os seus próprios filhos”. Para a cantora, “temos que repetir a Declaração dos Direitos Humanos todos os dias. Porque as pessoas escrevem, mas elas não agem”.

Abordando a temática da sexualidade, Daniela destacou que “Freud, mais de 100 anos atrás, já disse que nossa sexualidade é múltipla, caótica, e diversa – não é possível que ainda estejamos discutindo isso hoje”. Para ela, “não importa o que as religiões acham, essa é uma crença particular que as pessoas têm que guardar para si”.

A cantora finalizou afirmando que “algumas pessoas se acham no direito de pensar que são melhores do que nós. Quero pedir a todos para abrir seus corações e mentes. Quem é diferente não está errado. Todos possuem o direito de viver como querem”.

Daniela Mercury se disse impressionada “que a questão da diversidade ainda seja tratada com tanta dificuldade. Por isso que eu digo que é uma questão de educação”. A cantora acredita que o fato de o Brasil ser uma nação de migrantes, da diversidade pode ajudar o país a construir os avanços necessários, e inclusive trazer novas perspectivas para outros países mais violentos e cerceadores frente a esses direitos que o Brasil.

Para Daniela Mercury, “temos que garantir a visibilidade de quem somos, afirmar nossos direitos, tanto no dia da parada quanto em todos os outros dias: livres sim, iguais sim, mas todos os dias”. A cantora falou que não quer ninguém baixando o olho ao passar por ela e sua esposa: “Tenho muito orgulho de ser casada com Malu Verçosa e de ser lésbica”.