De cada dez votos em Levy Fidelix, sete vieram do Sudeste e do Sul
O Globo
Depois de toda a polêmica provocada pelas declarações homofóbicas no debate da Rede Record, no domingo, 446.878 brasileiros foram às urnas para mostrar apoio ao candidato do Partido Renovador Trabalhista do Brasil (PRTB), José Levy Fidelix da Cruz. O total alcançado por ele se revelou longe da “maioria” que ele conclamou a “enfrentar a minoria”: foi menos de meio por cento dos mais de 100 milhões de votos válidos depositados em todo o país. E, de cada dez destes eleitores, sete (68%) vieram dos estados do Sudeste e do Sul, segundo os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A maior votação, em volume, veio de São Paulo, onde 136.244 pessoas digitaram 28 no teclado e apertaram “confirma”. Em seguida, veio o Rio de Janeiro, com 65.015 pessoas que concordam com a ideia de “os homossexuais devem ser tratados psicologicamente, mas bem longe”, e o Paraná, com 33.612. Minas Gerais teve outros 25.939 eleitores do candidato que ficou conhecido, inicialmente, por defender a construção do “aerotrem”.
No Rio de Janeiro, em São Paulo e no Paraná, a votação de Fidelix ficou acima da média percentual do país, com 0,78%, 0,59% e 0,55%, respectivamente. O candidato teve sua votação mais expressiva proporcionalmente na capital do país: o Distrito Federal. Lá, 15.270 votos válidos, o equivalente a 0,97%, o dobro do resultado geral. Outros estados em que ele ficou acima da média foram Amazonas (0,61%), Alagoas (0,50%) e Roraima (0,51%).
Dos votos no estado do Rio, 27.355 (42%) vieram da capital – onde Fidelix também também alcançou percentual acima da sua média nacional: 0,85%. O quadro se repetiu nos principais municípios da Baixada Fluminense: Belford Roxo (0,92%), Duque de Caxias (0,93%), Magé (1%), Nova Iguaçu (0,96%) e São João de Meriti (1,07%). No estado de São Paulo, a capital representou pouco mais de um terço (36%) dos votos do candidato do PRTB.
Os estados que menos deram votos ao defensor da criação da conta-poupança de quatro salários mínimos – o “Título Cidadania, Brasil 21” – para todos os brasileiros, foram, proporcionalmente, foram Piauí (0,13%), Acre (0,16%) e Maranhão (0,21%).
Com o resultado deste domingo, Fidelix chegou à sua oitava disputa sem vitória. Ele tentou duas vezes se eleger prefeito de São Paulo (1996 e 2008); também fez duas tentativas para governador do estado de São Paulo (1998 e 2002), além de uma vez para vereador (2004) e uma vez para deputado federal (2006). Após as derrotas, decidiu tentar a presidência pela primeira vez em 2010, também sem chegar a 1% das preferências dos eleitores.
‘POLICROMIA DE OPINIÕES’
Para o cientista político Eurico Figueiredo, diretor do Instituto de Estudos Estratégicos (Inest) da Universidade Federal Fluminense (UFF), a distribuição dos votos de Levy Fidelix reflete a “policromia de opiniões” nos grandes centros do país, e uma maior polarização nos estados mais pobres.
— No tipo de sociedade mais complexa que vemos nas regiões metropolitanas, é normal que se expressem as mais diversas opiniões políticas, e nos estados menos favorecidos, a ênfase é maior na disputa entre ricos e pobres. Há menos espaço para certas nuances das classes médias.
Figueiredo compara a notoriedade obtida pelo candidato do PRTB a dos partidos radicais da Europa.
— São iguais na intolerância, na incapacidade de aceitar o “igual-diferente”, que é igual por ser cidadão, mas diferente por alguma característica particular. Na Europa, a bandeira não é a homofobia ou a proibição do uso de drogas, mas a etnia e a religião.
O pesquisador acredita que a tendência é que estes partidos ganhem mais simpatizantes nas próximas disputas.
— No Brasil, as pessoas ainda têm um certo receio de serem patrulhadas, de dizerem o que pensam. É um resquício da ditadura. Há quem seja contra o aborto, a favor da pena de morte… estas posições radicais todas existem. Acho que nós vamos ver cada vez mais isso, políticos que defendam publicamente essas ideias. Falta no Brasil um partido que expresse esse tipo de pensamento abertamente, mas dentro da lei, que proíbe diversas manifestações de preconceito (e o incentivo à violência). Há certas maneiras de expressar estas ideias. Isso é benéfico porque demonstra que a política brasileira comporta essa diversidade, e até para que fique claro que são parcelas minorítárias, como as urnas mostraram.
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PROGRAMA DE GOVERNO DE 8 PÁGINAS
Intitulado “Decálogo do Brasil prá (sic) frente”, o programa de governo apresentado pelo PRTB tem dez propostas, como indica o nome, distribuídas em oito páginas. Além do aerotrem e do monotrem “interligando as principais metrópoles brasileiras”, do “Título Cidadania Brasil 21”, e do “Banco de Poupança, Emprego e Desenvolvimento Econômico da Juventude”, que financiaria a entrada de jovens no mercado de trabalho com empréstimos nos moldes do BNDES, o candidato queria trabalhar na “implantação de dez novas usinas atômicas, espalhadas de norte a sul do país”.
O programa também previa a transformação do Bolsa-Família em “cláusula pétrea”, com a ampliação do teto de R$ 120 para R$ 510. Os financiamentos do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal teriam os prazos dilatados dos atuais 30 anos para 50 anos. Outra ideia era construir “presídios de segurança máxima em ilhas e navios”. Tudo isto, com a mesma fonte – vaga – de recursos: “1% do pré-sal”. O partido também colocaria “no Banco Central, um industrial, e no Ministério da Indústria e Comércio, um banqueiro, para que se conheça melhor as agruras de como é difícil produzir com toda sorte de risco e alta tributação e ainda gerar emprego e renda”.